Conheça a história de uma das casas mais antigas de Goiânia, que é mais velha que a capital
26/11/2025
(Foto: Reprodução) Conheça história de uma das casas mais antigas de Goiânia
Sob o olhar de uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, devidamente posicionada pelos donos no canto da sala de estar, uma das casas mais antigas de Goiânia guarda não só as paredes, o telhado, as portas e as janelas originais, mas uma história envolvida em mistérios e objeto, até os dias atuais, da curiosidade popular.
Localizado na esquina da rua Senador Morais Filho com a Avenida Sergipe, no Setor Campinas, o imóvel centenário chama a atenção por resistir ao tempo e ter se transformado em uma das principais referências sobre a memória do então município de Campinas, posteriormente incorporado à nova capital goiana. As origens da casa, no entanto, ainda não são totalmente conhecidas, nem pelos próprios donos.
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Avessa à exposição pública, a família herdeira falou sobre a casa sob a condição de anonimato e concedeu ao g1 acesso ao seu interior por reconhecer o valor histórico para a cidade (veja o vídeo acima). A mulher explica que atualmente ninguém mora no local, que foi residência dos seus avós e também de alguns tios.
Segundo o historiador Horieste Gomes, de 91 anos, que já escreveu oito livros sobre Campinas, um alemão chamado Karl Bartolomeu Steger foi quem construiu o imóvel. Ele diz que não se sabe o ano exato da construção, mas foi entre as décadas de 1910 a 1920. Muito antes, portanto, da fundação de Goiânia, em 1933. Lá, ele morou com a esposa, que era goiana, e as filhas.
"Ele era um uma pessoa instruída. Era um homem que a gente chama de dotado de categorias de valor, na sua formação. Inclusive, ele fazia conserto de sapatos muito bem. E também era músico", disse Horieste.
Casa centenária em Goiânia tem história envolvida em mistérios e atrai curiosos até hoje
Rafaella Barros/g1 Goiás
O historiador explica que Karl chegou a Campinas em uma época em que havia grande fluxo de alemães, principalmente os chamados padres e missionários redentoristas, que vieram para a região disseminar a doutrina católica. "A primeira leva de redentoristas veio direto da Alemanha. Depois, começou a surgirem redentoristas vindos de São Paulo", explica.
Redentoristas
Os redentoristas se fixaram principalmente na região de Trindade, Região Metropolitana da capital, no final do século XIX. Segundo o site do Santuário Divino Pai Eterno, o então bispo de Goiás, Dom Eduardo Duarte da Silva, viajou para a Alemanha e solicitou auxílio aos missionários da Congregação do Santíssimo Redentor. A forte relação histórica já foi reconhecida até mesmo pela Justiça.
Em 2020, um juiz autorizou a transferência dos restos mortais de sete missionários redentoristas que haviam sido enterrados no cemitério de Trindade para a Capela Mortuária, localizada na Igreja Santíssimo Redentor.
Horieste não sabe dizer qual foi o fim da vida de Karl. Registros do site "Family Search", porém, apontam que o alemão teria morrido em 1933, com apenas 32 anos. Mantido por uma organização internacional sem fins lucrativos que ajuda pessoas a descobrirem informações sobre antepassados, o site informa que Karl se casou com Bárbara da Silva Moraes em 1925, com quem teve quatro filhas.
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Lacunas na história
A transição do imóvel das mãos da família de Karl para as dos atuais donos é um mistério. A senhora que recebeu a reportagem, e pediu para que nem ela nem os outros proprietários fossem identificados, contou que eles nunca ouviram falar do alemão. Ela diz que não sabe se os avós compraram a casa dele e que se lembra apenas de um comentário do avô sobre quando ele começou a morar lá.
"Eu só sei que uma das coisas que eles contavam é que quando o vovô se mudou para cá, a casa era tão nova que a madeira cheirava", disse a mulher, referindo-se à madeira de aroeira, a partir da qual foi feito o telhado.
Segundo a proprietária, ninguém mora na casa porque há receio quanto à resistência do telhado, bastante deteriorado. "Como está chovendo demais, é perigoso". Eventualmente um dos outros donos fica na sala, lendo livros, aproveitando a brisa que corre por dentro do imóvel antigo, proporcionada pelo pé direito bastante elevado, de cerca de quatro metros.
Olhar de curiosos
Vizinho da casa há cerca de 20 anos, mas morador do entorno desde muito jovem, o aposentado José Iads, de 80 anos, conta que também não sabe muito da história do imóvel.
José relata que a casa chegou a ser um pequeno comércio por um tempo, uma espécie de mercearia. A informação condiz com a recordação da proprietária que conversou com o g1. "Eu lembro que a vovó alugava um cômodo da frente, para um vizinho nosso, que fez um armazém. Isso há uns 60, 65 anos atrás", disse.
Segundo o vizinho, o imóvel atrai olhares curiosos há muitos anos. "Essa casa gera curiosidade demais. Todo mundo que passa fica olhando", afirmou.
Sócio de uma grande loja de artigos católicos, localizada na mesma calçada da casa, Agnaldo Duarte, de 63 anos, diz que é encantado pelo imóvel há muitos anos.
"Eu já entrei lá. É bonitinha, arrumadinha. É um patrimônio histórico, tem que ser preservado. Chama muita atenção mesmo. Eu sou apaixonado por essa casa", disse.
O apego à construção também é da própria família herdeira, que reconhece que o principal motivo de tanta atenção que a casa recebe é o componente histórico, evidenciado pela arquitetura antiga. Eles relatam que não há planos para vender a casa, que deve ser preservada para as próximas gerações.
Casa considerada uma das mais antigas de Goiânia, em Goiás
Rafaella Barros/g1 Goiás
Estudo para tombamento
O reconhecimento popular e familiar da importância da casa pode ser oficializado em breve. A Secretaria de Cultura (Secult) de Goiânia pretende fazer um levantamento histórico da casa no próximo ano. A pasta informou ao g1 que esse será primeiro passo do processo que visa ao tombamento do imóvel como patrimônio.
"Esse estudo deve apresentar quem foi Karl Bartolomeu Steger, qual a importância de sua família para a região, o pioneirismo que representam, a data de construção do imóvel e os fatores que conferem relevância cultural e histórica à edificação", disse a Secult, em nota.
Segundo a Secult, o levantamento objetiva demonstrar o valor da casa para a cidade e para a sociedade local, levando-se em conta a sua contribuição para a memória comunitária, seu papel no desenvolvimento urbano e "o seu significado como testemunho arquitetônico de época".
A secretaria explica que todo o processo é feito em conjunto com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a quem cabe a palavra final sobre o tombamento.
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